O surto de COVID-19 está criando uma pressão sem precedentes nos serviços de saúde em todo o mundo. É importante, agora mais do que nunca, que forneçamos à força de trabalho de nossos parceiros de saúde (médicos, enfermeiros, engenheiros e outros que prestam serviços à área da saúde), recursos para apoiar a saúde mental e bem-estar, pois o trauma psicológico afeta a saúde dos profissionais que lidam com o coronavírus e possivelmente irão interferir na qualidade de decisões e ações na vida profissional, nas relações intimas e familiares. O risco de espalhar o vírus para suas famílias é grande, muitas vezes obrigando os profissionais de saúde a se isolarem totalmente dos seus familiares por um longo período, fazendo com que o medo e insegurança, além da saudade, aumentem.
A medicina já é uma profissão estressante em circunstâncias normais, as demandas físicas, muitas vezes a impotência diante da perda de um paciente, a tensão psicológica, os processos de trabalho ineficazes e a sobrecarga horária podem levar ao esgotamento, condição que afeta até 50% dos médicos, enfermeiros, paramédicos, e outros profissionais que lidam diretamente com o sistema médico hospitalar.
O esgotamento psicológico é uma resposta às demandas e condições de saúde na situação atual, portanto, o apoio psicológico nesse momento é fundamental como parte das ações de enfrentamento ao COVID-19.
Como a pandemia afeta grande parte da sociedade, os profissionais de saúde da linha de frente estão carregando o fardo pesado de uma falta de preparação sistêmica. A resposta lenta do governo, juntamente com o atraso na disponibilidade dos testes, permitiu que o vírus se espalhasse rapidamente em alguns locais. Operações enxutas deixaram muitos hospitais sem condições de expandir rapidamente os recursos necessários ao amplo atendimento. A demanda global por equipamentos de proteção individual (EPI) e ventiladores tornou esses suprimentos cruciais ainda mais escassos e inflacionados. Os estoques de reserva se mostraram muito pequenos e os esforços para reforçar os suprimentos foram descoordenados ou, pior, forçaram hospitais e jurisdições a competirem entre si. Atualmente, nas áreas mais atingidas pelo COVID-19, os médicos de emergência lutam para atender um volume grande de pacientes, já em estado avançado da doença.
Os profissionais de saúde não estão apenas tratando uma enxurrada de pacientes críticos durante a pandemia, eles estão arriscando sua própria saúde, testemunhando altas taxas de mortes e experimentando falhas de protocolo e suporte, estresses agudos que podem levar a problemas de saúde mental, e que podem se agravar diante da falta apoio terapêutico.
Covid-19 ataca os pulmões e deixa sequelas respiratórias
Embora a pandemia do novo coronavírus, ainda seja um mistério em muitos aspectos, médicos e pesquisadores do mundo todo já sabem é que o pulmão é o órgão mais afetado pela doença. Nos pulmões, o vírus infecta células dos alvéolos, local onde ocorre a troca de gases entre o pulmão e corrente sanguínea, e a partir daí começa a se multiplicar, mata a célula hospedeira e é liberado para contaminar outras células.
Estas células começam a ficar ativadas e liberam uma série de mediadores que geram a inflamação no pulmão e no corpo inteiro. A inflamação do pulmão gera pneumonia com várias partes do pulmão acometidas e, nos casos mais graves, pode gerar a insuficiência respiratória crônica. Os pacientes que se recuperam da COVID-19 podem apresentar um processo de fibrose pulmonar, que é um tipo de sequela. Pessoas recuperadas desse processo infeccioso grave podem ficar “cansadas” a ponto de não conseguirem fazer suas atividades com tanta agilidade, apresentando falta de ar e fraqueza devido ao alto tempo de coma induzido, quando em ventilação mecânica.
O coronavírus ataca outras partes do corpo além do sistema respiratório e pode causar danos nos globos oculares, dedos dos pés, intestino e rins.
O trauma pode ser comparado a algo extremamente violento, como um acidente de carro ou um tiroteio, a situação é traumática quando “viola” as expectativas familiares sobre a vida e o mundo de alguém, enviando-as para um “estado de extrema confusão e incerteza”.
No caso dessa pandemia, a incerteza prolongada é agravada pela angústia moral que os profissionais de saúde enfrentam quando não têm recursos adequados para tratar pacientes gravemente enfermos, se tornando uma lesão moral, um termo emprestado das forças armadas, que ocorre quando uma pessoa faz algo que vai contra suas crenças morais profundamente enraizadas.
Uma pesquisa feita com médicos e enfermeiros durante o auge da pandemia de COVID-19 na China, constatou que cerca de 50% dos entrevistados relataram sintomas de depressão, 44% relataram sintomas de ansiedade e 34% relataram insônia. A maioria não tem tempo ou flexibilidade para procurar um terapeuta durante um dia de trabalho, sofrendo silenciosamente.
Especialistas acreditam que os profissionais de saúde podem desenvolver altas taxas de ansiedade, depressão, irritabilidade, transtorno de estresse agudo, burnout, problemas com uso de substâncias ilícitas, dentre outros, e, eventualmente, estresse pós-traumático como resultado da realidade que estão enfrentando.
Portanto é importante reconhecer a necessidade de apoio a esses profissionais oferecendo terapia e agendamento mais flexível, além de estabelecer uma linha direta de suporte. Esse suporte expandido à saúde mental precisa ser contínuo e de amplo escopo, abordando problemas sistêmicos, como a escassez de profissionais de saúde psicológica em todo o país e obstáculos regulatórios que limitam os serviços de telemedicina.
Tele terapia, aplicativos de meditação e outros serviços virtuais de saúde tem que fazer parte da solução para esses profissionais, a população em geral, e outros terapeutas a veem como uma ferramenta crucial para alcançar também os profissionais de saúde. Psicólogos também recomendam que, neste momento, os gestores dos serviços de saúde possam atuar de forma ativa, oferecendo informações para colaborar na redução dos níveis de ansiedade. “Fixar informativos nos locais próximos ao ponto ou de circulação dos profissionais e se colocar disponíveis para a escuta poderá fazer com que os trabalhadores percebam que não estão sozinhos e que tem o apoio da instituição”.
Minimizar o sofrimento psíquico das equipes permite o melhor desempenho de suas funções.
O gestor que fornecer apoio, monitorar o estresse e reforçar procedimentos de segurança irá fazer com que seus colaboradores se sintam cuidados em momentos difíceis.
Felizmente vários hospitais e até mesmo o Ministério da Saúde (através do SUS) já se conscientizaram dessa situacão e estão disponibilizando aos seus profissionais o serviço virtual (e as vezes até mesmo presencial) de sistemas de acolhimento psicológico.
Os super-heróis profissionais da saúde vão tão longe para proteger vidas, então precisamos protegê-los da angústia mental. Como soldados voltando da guerra, esses profissionais levarão tempo para processar e curar, quando a crise médica aguda terminar, uma crise de saúde mental pode surgir, precisamos estar prontos. Certamente, um dos ensinamentos desse período é que a pandemia obriga todos a reorganizar modos de vida e conviver com a apreensão e as dores ligadas às consequências diretas e indiretas da doença.
“Cuidar de si mesmo também é uma forma de cuidar do outro”